
A 8ª Assembleia Geral da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, realizada na comunidade Barro/Surumu, em Pacaraima, abriu espaço para a apresentação de uma iniciativa inédita voltada às mulheres e meninas da região: o projeto “Acesso à Justiça para Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia”, do Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR).
A proposta foi levada à Assembleia pela Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Cevid) e pela Coordenadoria da Infância e Juventude (CIJ), o que contribui para estreitar o diálogo entre o Judiciário e as comunidades indígenas em torno da cidadania e da proteção de direitos.
Esta é a quarta reportagem da série especial “Justiça e Proteção: Um Olhar para Bonfim e Normandia no Combate à Violência Contra Mulheres e Crianças”. Após abordar o lançamento do projeto e o processo de planejamento conduzido pelo Judiciário roraimense, esta edição mostra a chegada da iniciativa “Acesso à Justiça para Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia” à Terra Indígena Raposa Serra do Sol, durante a 8ª Assembleia Geral realizada na comunidade Barro/Surumu, em Pacaraima.
Voltado para os municípios de Bonfim e Normandia, ambos situados na fronteira com a Guiana e marcados pela presença significativa de populações indígenas, o projeto nasceu da necessidade de enfrentar um cenário preocupante de vulnerabilidades sociais e altos índices de violência.
Um relatório da Cevid/TJRR revelou que a proporção de mulheres indígenas atendidas por medidas protetivas chegou a 48,1% em 2023, subindo para 50% em 2024. A maioria das vítimas tinha entre 26 e 50 anos, mas o levantamento também evidenciou casos envolvendo jovens entre 17 e 25 anos, refletindo a urgência em garantir proteção e oportunidades de futuro mais seguro.
A realidade de crianças e adolescentes reitera a gravidade da situação. Dados da CIJ/TJRR apontaram que Roraima registrou, em 2023, a maior taxa nacional de estupro e estupro de vulnerável, com 112,5 casos por 100 mil habitantes — índice quase três vezes maior que a média nacional, de 41,4 casos. Em Bonfim e Normandia, a distância da capital e as limitações de serviços especializados tornam o quadro ainda mais desafiador.
Foi a partir desse diagnóstico que o TJRR estruturou o projeto como uma estratégia concreta para ampliar a rede de proteção, garantir acompanhamento especializado e aproximar a Justiça da vida das meninas e mulheres que mais precisam dela.
Segundo a juíza Suelen Alves, coordenadora da Cevid e titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar, a Assembleia representou um momento de escuta e construção coletiva.
“Aproveitamos a oportunidade para apresentar a proposta diretamente às lideranças, explicar seus objetivos e, principalmente, ouvir a comunidade. É fundamental respeitar a autonomia dos povos indígenas e atuar com o consentimento deles”, destacou. |
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A magistrada acrescenta que o Acesso à Justiça para Meninas e Mulheres não tem caráter punitivo, mas educativo e transformador, voltado à promoção de direitos e da cidadania.
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“Não é um projeto que entra nas comunidades para procurar culpados, mas para garantir direitos. Queremos que meninas e mulheres indígenas conheçam a rede de proteção e saibam que podem viver livres da violência”, explicou.
Durante o encontro, a iniciativa recebeu apoio expressivo das lideranças indígenas, especialmente das mulheres tuxauas, que manifestaram interesse em contribuir ativamente com as ações.
“Elas foram muito receptivas e firmes ao afirmar que a violência contra mulheres e meninas não faz parte da cultura indígena”, relatou a juíza
O projeto prevê a realização de palestras, oficinas e rodas de conversa voltadas ao fortalecimento da rede comunitária e à disseminação de informações sobre os direitos das mulheres. Um dos avanços debatidos na Assembleia foi a autorização para capacitar os vigilantes das comunidades indígenas — figuras que atuam como guardas locais — sobre direitos, deveres e condutas ilícitas relacionadas à violência doméstica.
“Muitas comunidades têm seus próprios regimentos e sistemas de segurança. A proposta é preparar esses vigilantes para acolher e compreender as situações de violência, tornando-se parceiros nessa luta”, explicou a juíza.
A magistrada também ressaltou que a Cevid e a CIJ estão construindo um protocolo específico de atendimento para os casos de violência identificados durante as ações educativas, assegurando acolhimento humanizado e encaminhamento adequado às autoridades competentes.
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“Toda vez que se fala sobre violência, criamos um ambiente acolhedor, e muitas vezes surgem relatos de situações reais. Por isso, precisamos de um fluxo bem definido de acolhimento e resposta, para garantir que cada mulher seja ouvida e protegida. Levar a Justiça até essas mulheres é levar dignidade, autonomia e esperança. Vivemos em uma sociedade ainda marcada pelo machismo e pela desigualdade, mas tudo que é cultural pode ser mudado. E é essa mudança que queremos promover”, concluiu. |
A apresentação do projeto durante a Assembleia não apenas o divulgou, mas consolidou um compromisso entre o Judiciário e os povos indígenas: levar o acesso à Justiça para dentro dos territórios. Essa iniciativa visa transformar dados em ações que geram dignidade, conhecimento e novas possibilidades de futuro. É fundamental notar a relevância dessa ação na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, que, de acordo com dados do DSEI Leste/RR, abriga aproximadamente 33.979 pessoas, pertencentes principalmente aos povos Patamona, Macuxi e Ingarikó.

A servidora da CIJ, Isabeau Cristina, destacou que o contato com as comunidades indígenas é essencial para dimensionar a atuação do projeto junto às mulheres indígenas.
“As comunidades indígenas possuem uma hierarquia muito bem definida e protocolos próprios de consulta. Participar da Assembleia foi essencial, pois seria inviável visitar cada comunidade e conversar individualmente com todos os tuxauas para obter autorização. Esse espaço nos permitiu apresentar o projeto de forma ampla e, ao mesmo tempo, respeitosa, garantindo o consentimento e o apoio das lideranças locais. Nosso objetivo é sempre atuar em conformidade com as tradições e a organização social de cada povo”, explicou.
PROTEÇÃO
O projeto “Acesso à Justiça para Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia”, uma iniciativa do Tribunal de Justiça de Roraima, foi lançado em 29 de setembro no auditório do Fórum Ruy Barbosa, Comarca de Bonfim. A proposta central é ampliar a proteção e o acesso à Justiça para meninas e mulheres em situação de vulnerabilidade nessa região de fronteira com a Guiana, que enfrenta desafios sociais, econômicos e se caracteriza pela presença de comunidades indígenas e migrantes. A estratégia do projeto inclui atendimentos itinerantes, ações educativas e o fortalecimento da rede local de apoio e acolhimento.
O projeto envolve os setores: Gabinete da Juíza Auxiliar da Presidência, a Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Cevid), a Coordenadoria da Infância e Juventude (CIJ), o Núcleo de Projetos e Inovação (NPI) e o Núcleo de Comunicação e Relações Institucionais (NUCRI).
Um destaque crucial que motivou a ação: dados da Cevid/TJRR revelam que quase metade das medidas protetivas emitidas em 2023 e 2024 envolveu mulheres indígenas, sublinhando a urgência de intervenções específicas para essa área.
Complementando o projeto, o NUCRI lançou a série especial “Justiça e Proteção: Um Olhar para Bonfim e Normandia no Combate à Violência Contra Mulheres e Crianças”, composta por seis reportagens multimídia que detalham os impactos da iniciativa e o papel do Judiciário na defesa dos direitos femininos e infantis.
A matéria possui conteúdo multimídia. Abaixo a descrição:
Item 1: A imagem mostra um ambiente coberto, onde nove pessoas estão alinhadas atrás de uma mesa retangular coberta com uma toalha xadrez nas cores verde e vermelha. À frente da mesa há frutas regionais. Atrás do grupo, há uma grande faixa marrom com o título “VIII Assembleia da Terra Indígena Raposa Serra do Sol” e o lema “Sem território, não existiria vida”. À esquerda da faixa, há o mapa colorido da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e desenhos de cestos tradicionais. As pessoas na foto estão em pé, lado a lado, algumas vestindo coletes bege com crachás de identificação e outras com uniformes da Polícia Federal. À esquerda, duas mulheres indígenas usam camisas verdes com o brasão da assembleia; ao centro, um homem de boné alaranjado veste camisa azul; e à direita, dois policiais federais usam uniformes pretos. Sobre a mesa, há garrafas de água, frutas e cestos artesanais de palha. No alto, um brasão redondo traz os dizeres “Segurança, Trabalho e Paz”.
Item 2: Vídeo horizontal da entrevista da juíza Suelen Alves, coordenadora da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Cevid) e titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar, sobre o projeto Acesso à Justiça para Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia.
Item 3: Vídeo horizontal da entrevista com a juíza Suelen Alves, coordenadora da Cevid e titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar, sobre o projeto Acesso à Justiça para Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia.
Item 4: Vídeo horizontal da juíza Suelen Alves, coordenadora da Cevid, falando sobre o projeto Acesso à Justiça para Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia.
Item 5: A imagem mostra um galpão amplo com dezenas de pessoas sentadas em fileiras de cadeiras plásticas brancas, participando de um evento. A foto é tirada de trás da mesa principal, mostrando duas mulheres — uma de cabelos longos e outra de cabelos cacheados — voltadas para o público. Na mesa, coberta com tecido bege e toalha xadrez em verde e vermelho, há um cesto de palha com frutas verdes e um feixe de colmos de bambu. No teto, pendem cachos de bananas verdes como parte da decoração. O público, formado majoritariamente por pessoas indígenas, escuta atentamente. Ao fundo, há árvores, pessoas em pé e veículos estacionados, indicando que o evento acontece em um espaço aberto cercado por área verde.
Item 1: A imagem mostra um ambiente coberto, onde nove pessoas estão alinhadas atrás de uma mesa retangular coberta com uma toalha xadrez nas cores verde e vermelha. À frente da mesa há frutas regionais. Atrás do grupo, há uma grande faixa marrom com o título “VIII Assembleia da Terra Indígena Raposa Serra do Sol” e o lema “Sem território, não existiria vida”. À esquerda da faixa, há o mapa colorido da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e desenhos de cestos tradicionais. As pessoas na foto estão em pé, lado a lado, algumas vestindo coletes bege com crachás de identificação e outras com uniformes da Polícia Federal. À esquerda, duas mulheres indígenas usam camisas verdes com o brasão da assembleia; ao centro, um homem de boné alaranjado veste camisa azul; e à direita, dois policiais federais usam uniformes pretos. Sobre a mesa, há garrafas de água, frutas e cestos artesanais de palha. No alto, um brasão redondo traz os dizeres “Segurança, Trabalho e Paz”.
Item 2: Vídeo horizontal da entrevista da juíza Suelen Alves, coordenadora da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Cevid) e titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar, sobre o projeto Acesso à Justiça para Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia.
Item 3: Vídeo horizontal da entrevista com a juíza Suelen Alves, coordenadora da Cevid e titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar, sobre o projeto Acesso à Justiça para Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia.
Item 4: Vídeo horizontal da juíza Suelen Alves, coordenadora da Cevid, falando sobre o projeto Acesso à Justiça para Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia.
Item 5: A imagem mostra um galpão amplo com dezenas de pessoas sentadas em fileiras de cadeiras plásticas brancas, participando de um evento. A foto é tirada de trás da mesa principal, mostrando duas mulheres — uma de cabelos longos e outra de cabelos cacheados — voltadas para o público. Na mesa, coberta com tecido bege e toalha xadrez em verde e vermelho, há um cesto de palha com frutas verdes e um feixe de colmos de bambu. No teto, pendem cachos de bananas verdes como parte da decoração. O público, formado majoritariamente por pessoas indígenas, escuta atentamente. Ao fundo, há árvores, pessoas em pé e veículos estacionados, indicando que o evento acontece em um espaço aberto cercado por área verde.
Texto: Tarsira Rodriges e Mairon Compagnon - Jornalista
Fotos: NUCRI/TJRR
OUTUBRO/2025 – NUCRI/TJRR
Fotos: NUCRI/TJRR
OUTUBRO/2025 – NUCRI/TJRR